Morar sozinho às vezes não é fácil...
Principalmente se você é homem, solteiro, longe da família, longe de casa, no meio da Amazônia, sem máquina de lavar, sem liquidificador, etc.
Coisas que eu detesto: lavar roupa, e mais do que isso, passar roupa! Eu voltaria no tempo e mataria a primeira pessoa que inventou que os tecidos devem ser passados! Diabos! Deveríamos deixá-los amassados ao natural... algo muito mais prático! Rs.
Como médico, e também no Exército, utilizo jaleco branco para o atendimento. E claro, esta é uma peça de deve estar sempre bem lavada e passada. Antes, no Rio, era só jogar na máquina de lavar e pronto. Mas aqui...
Outro dia eu cheguei em casa e passei no mercadinho que fica embaixo do apartamento onde estou morando. Fui conversar com a dona do mercadinho, chamada Sula.
- Sula, me dá uma ajuda? O que eu posso fazer para deixar meu jaleco mais branco quando eu for lavá-lo?
- Simples! Mistura álcool na água e usa anil.
- Álcool? Anil?
- É! Na água com sabão, coloca um pouco de água, depois enxagua com o anil.
- Tá. Coloco o jaleco na água com sabão, jogo álcool...
- Não! Não! Pega o balde, coloca água, dissolve bem o sabão em pó, e coloca um pouco de água. Só depois coloca o jaleco, e deixa de molho até ficar limpo!
- Até ficar limpo? Isso não vai dar certo! Quanto tempo de molho?
- Ah... você vai olhando e tira quando estiver limpo!
- Não, Sula, não vai dar certo. me diz um tempo! Eu cronometro e tiro o jaleco!
- Tá bom.... (rindo) umas duas horas. Depois enxagua no anil.
- Anil? Tá... o que é isso?
- Essa pedrinha azul aqui. (pega uma pedra azul menor que uma caixa de fósforo). Dissolve 1/4 dessa pedra em um balde de água. Aí enxagua o jaleco lá!
- Peraí... eu lavo o jaleco na água e sabão e álcool por 2 horas, tiro do balde, passo uma água, depois deixo de molho na água com anil?
- Não! Não deixa de molho... só enxagua! Só molha ele ali dentro por um minutinho.... e pronto! O anil vai deixar o branco com aquele reflexo azul bonito!
- Sula... Eu não posso manchar meu jaleco de azul! Ele tem que ficar branco! Eu não vou colocar ele numa solução azul! Vai manchar!
- (rindo muito) Não vai não! Vai ficar um branco bonito! Você vai ver!
A pedra de anil custou R$0,50!
Morri de medo ao colocar meu jaleco na solução azul...
Mas não é que ele ficou bem mais branco?
Mas sinceramente... não vejo a hora de ter uma máquina de lavar à disposição de novo!
Fui pesquisar sobre essa tal pedrinha azul....
(Fonte: baseado em
http://estelanaurania.blogspot.com/2010/01/azul-anil-azul-3.html)
O anil é um corante extraído das folhas da planta (anileira). O anil é cultivado no Brasil, Espanha e na África, no Senegal, no Egipto, na Ásia, em Manila e Java. O fato de se comercializar em pó ou em pedra, fez acreditar durante muito tempo que se tratava de um mineral e não de um vegetal.
O corante natural é obtido, há vários milênios, a partir de plantas como Isatis tictorum e a Indigofera tinctorum,L.. A primeira, comum em climas temperados, produz o “pastel” ou o “ouro azul”, fonte de riqueza de algumas regiões europeias até ao fim do século XVI. Depois o pastel dá lugar ao azul de espécies de Indigofera, provenientes da Índia. Nas Américas, a planta era usada pelos nativos para tingir fios de algodão. Enquanto que noutras regiões os colonizadores procuraram aprender a técnica de produção de tinta azul, no Brasil, a presença da planta nativa no litoral, parece não ter chamado a atenção dos portugueses até finais do século XVII. Um século depois, no entanto, já existiam textos em que se discutia a preparação do anil.
A produção exigia passos razoavelmente conhecidos: partes da planta eram colhidas, geralmente no início da floração, e colocadas num tanque destinado à fermentação. Esse tanque comunicava com um segundo, para onde era transferido apenas o líquido proveniente da fermentação. Aí, este líquido era “batido” durante várias horas, até que dele era se separasse um sólido azul, que era recolhido e posto a secar. O material seco, na forma de “pedras”, era usado para tingir ou branquear fios e tecidos de lã, algodão e seda. Segundo o que se pensava na época, a fermentação promovia a reunião das partículas corantes, daí resultando um líquido verde (mistura de azul e amarelo). O método de “bater” o líquido fermentado, fazia com que as partículas corantes azuis se separassem das amarelas, depositando-se no fundo do segundo tanque.
Hoje, em termos químicos, podemos dizer que o índigo não existe na planta. É a indicona (um glicosídio) que fermenta, produzindo glicose e um leucocomposto que por oxidação origina o corante azul. No século XVIII, centenas de fábricas funcionavam no Rio de Janeiro, na Baía e no Pará. Nesta altura, a quantidade de corante importada por Portugal era suficiente para suprir as necessidades das nossas fábricas e ainda sobrava produto para reexportação. Mas, no século XIX, o comércio começou a declinar. O anil brasileiro não conseguia competir com o indiano, que chegava a Portugal a preços mais baixos. Além disso, o produto brasileiro começava a ficar desacreditado por reclamações de adulteração e má qualidade.
A Basf é hoje responsável por cerca de metade da produção mundial de índigo sintético, sendo poucos os que se dedicam, de forma alternativa, á preparação de índigo de origem vegetal. Mesmo as “pedras de anil”, tão populares há poucas décadas, já não são usadas para clarear a roupa.
OBS - exceto em Tefé, onde eu uso!